Quando me sentei pela primeira vez para escrever sobre o SOAR, confesso, senti uma pontada de orgulho. Há coisas que nos conectam ao que há de mais avançado no mundo, e saber que o Brasil deixou sua marca no telescópio instalado no Cerro Pachón, no Chile, é uma delas. Mais do que um instrumento de observação, ele é palco de uma história de desafios, tecnologia e colaboração que culminou na chegada do espectrógrafo STELES – e isso, no fundo, vai muito além de ciência.
Um novo tempo para o SOAR
O telescópio SOAR sempre foi referência. Com seus 4,1 metros de diâmetro e localização privilegiada a mais de 2.700 metros de altitude, ele permite observar o céu do hemisfério sul em detalhes jamais imaginados décadas atrás. Sigo fascinado lendo relatos de noites límpidas, cheias de estrelas exóticas e fenômenos surpreendentes que já foram revelados pela cúpula giratória do SOAR.
O que me surpreende constantemente é como, mesmo um telescópio já consagrado, pode se transformar. E foi exatamente o que aconteceu nos últimos anos: o SOAR ganhou um novo coração óptico, com a instalação do Espectrógrafo Echelle do Telescópio SOAR (STELES). Esse instrumento não apenas modernizou o telescópio, mas abriu caminho para investigações muito mais detalhadas, principalmente na busca por sinais das estrelas mais antigas e pouco luminosas do universo.
- Localização: Cerro Pachón, Chile
- Espelho principal: 4,1 metros
- Campo de observação: vários minutos de arco
- Operação: 320 nm (ultravioleta) ao infravermelho próximo
- Novidade: Adição do STELES
Segundo informações detalhadas do guia para astrônomos visitantes do SOAR, as condições excepcionais de observação, combinadas à variedade de instrumentos, são as grandes responsáveis pelo seu protagonismo científico.
Desafios e colaboração internacional
Eu costumo imaginar laboratórios borbulhando de ideias, cálculos, conversas rápidas entre cientistas. Porém, quando penso no desenvolvimento do STELES, a imagem mais justa é de um trabalho paciente, persistente e internacional.
- O projeto STELES levou nove anos de intensa cooperação entre equipes brasileiras e chilenas.
- Foram enfrentados obstáculos técnicos – como garantir precisão máxima em cada componente óptico.
- Houve atrasos provocados, especialmente, pela pandemia de COVID-19, que paralisou o mundo e testou o ânimo dos envolvidos.
- O Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA/MCTI), o Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP (IAG/USP) e o CTIO foram peças-chave nessa história.
Não sou só eu que reconheço o valor desse tipo de colaboração. A história do Observatório de Cerro Tololo (CTIO) revela que investigações conjuntas, como estas do hemisfério sul, mudaram nossa visão sobre galáxias vizinhas, como as Nuvens de Magalhães, e sobre as propriedades únicas do nosso próprio canto da Via Láctea.
Ciência não tem fronteiras, e o STELES nasceu desse espírito.
STELES em detalhes: um espectrógrafo único
Um instrumento como o STELES não é apenas um acessório para o telescópio; ele é o olhar refinado, que permite enxergar o invisível. Falo isso com a empolgação de quem viu resultados que não seriam possíveis anos atrás. Com o STELES, é viável dissecar a luz estelar, analisando cada fragmento para descobrir segredos fundamentais.
Como funciona o STELES?
O segredo do STELES está em sua capacidade de dividir a luz em dois “braços”.
- Braço azul: Analisa o intervalo entre 300 e 550 nanômetros.
- Braço vermelho: Vai de 530 até 890 nanômetros.
Essa divisão permite observar simultaneamente uma enorme faixa do espectro, com alta precisão, graças ao uso de grades Echelle altamente sofisticadas.

O conjunto óptico, detalhadamente concebido por Bernard Delabre, do ESO, foi ajustado pelo pessoal do LNA/MCTI e do IAG/USP. Os detectores de imagem, essenciais para registrar cada fóton captado, foram projetados e testados no CTIO, garantindo performance de ponta.
Com essa combinação, o STELES está pronto para decifrar composição química, movimentos, rotações e até distâncias de astros tão distantes que, por vezes, desafiam a própria imaginação.
A primeira luz: um tributo marcado por emoção
Em agosto, o STELES finalmente viu a “primeira luz”. É como se um novo sentido tivesse sido dado ao telescópio. Conta-se, nos bastidores, que a escolha do primeiro alvo não foi aleatória: Eta Carinae. Eu já ouvi muitos astrônomos dizerem que há algo quase místico na escolha do primeiro objeto observado – e no SOAR, essa escolha foi carregada de significado.
- Sistema binário Eta Carinae: Protagonista de uma explosão em 1837, ficou tão brilhante à época que rivalizou com Sírius, a estrela mais visível do céu.
- Hoje, parece discreta, envolta pela densa Nebulosa Homúnculo.
- A estrela principal detém cerca de 90 massas solares; a companheira, cerca de 30. Juntas, apresentam luminosidade maior que cinco milhões de sóis.
A escolha de Eta Carinae foi uma homenagem ao astrônomo brasileiro Augusto Damineli. Foi ele quem defendeu de forma vigorosa – e inovadora para a época – que Eta Carinae era um sistema binário, abrindo portas para novas interpretações sobre a vida e a morte de estrelas supermassivas. E, não menos importante, liderou o esforço que viabilizou os recursos necessários ao STELES.

Por trás dos números, vidas dedicadas a expandir nossos horizontes.
STELES e a busca pelas primeiras estrelas (População III)
Ao me debruçar nas pesquisas, percebi um objetivo claro: buscar astros quase intocáveis, que nunca foram vistos diretamente, mas que guardam as respostas sobre como tudo começou. O STELES, unido à potência do SOAR, é ideal para encontrar vestígios das estrelas da População III.
- São estrelas formadas nos primórdios do universo, compostas quase totalmente de hidrogênio e hélio.
- Carregam pouquíssimos elementos mais pesados (“metais”), resultado de sua formação pouco após o Big Bang.
- Nunca foram detectadas diretamente, apenas inferidas por modelos e observações indiretas.
Com a sensibilidade sem precedentes do STELES e a capacidade analítica do SOAR, há uma nova esperança nessa busca. Em minhas conversas com astrônomos, noto que muitos vislumbram, para os próximos anos, uma transição: de hipóteses, para a observação direta dessas primeiras estrelas.
A expectativa é que, após um período de mais testes e ajustes, a busca sistemática pelas estrelas da População III comece em 2026. Isso pode revolucionar nosso entendimento não apenas sobre a formação das primeiras estrelas, mas também sobre a evolução da própria Via Láctea e de sistemas planetários contemporâneos.

As perguntas centrais que guiam os cientistas agora são:
- Como as estrelas da População III influenciaram o surgimento de elementos pesados?
- Quais as etapas que levaram à diversificação de estrelas e planetas?
- Que segredos sobre a matéria escura e a evolução do universo estão escondidos nesses fósseis cósmicos?
Sinto que estamos, de certo modo, na antecâmara de uma das maiores aventuras científicas do século.
Detalhes técnicos: por dentro do STELES
Talvez muita gente não tenha ideia do quão complexa é a montagem de um instrumento científico desse porte. Cada peça do espectrógrafo foi pensada para aproveitar ao máximo a luz que chega do universo distante. Eu me surpreendo ao ver como o estudo da óptica, aliado à tecnologia das câmeras CCD, levou à eficiência notável do STELES.
- Projeto óptico: Responsabilidade de Bernard Delabre (ESO), especialista em instrumentos de alta resolução.
- Estrutura mecânica: Desenvolvida pelo LNA/MCTI e IAG/USP.
- Detetores de CCD: Projetados e testados no CTIO, garantindo baixo ruído e alta sensibilidade.
- Duas faixas espectrais: Permitem separar diferentes elementos e analisar simultaneamente múltiplas características de um astro.
O uso de grades Echelle é outro diferencial, pois, combinado aos dois braços do instrumento, cria uma rede de informações detalhadas em bandas largas do espectro. Com isso, o SOAR pode, em poucas horas de observação, captar detalhes de objetos extremamente tênues, ampliando o tipo de investigação possível na astronomia moderna.

Tecnologia, quando bem aplicada, expande nossos próprios sentidos.
O papel das instituições e a importância cultural do SOAR
Nenhuma conquista deste porte é isolada. Desde o início, o SOAR é descrito como um projeto internacional, contando com a expertise brasileira, mas também de grandes centros norte-americanos.
- Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (Brasil)
- NSF NOIRLab
- Universidade da Carolina do Norte (UNC)
- Universidade Estadual de Michigan
Me chamou a atenção o respeito às comunidades tradicionais expressado pelos parceiros do NOIRLab. Eles enfatizam explicitamente o reconhecimento das importâncias culturais e espirituais dos lugares onde instalam suas infraestruturas, como I’oligam Du’ag para a Nação Tohono O’odham e Maunakea para o povo Kanaka Maoli. Pena que nem sempre vemos isso em projetos científicos – aqui, é uma lição de humildade e respeito.

E, claro, o aniversário de 50 anos do CTIO foi celebrado não apenas pelas descobertas, mas também pelo papel fundamental em formar gerações de astrônomos e em criar uma rede de cooperação global no hemisfério sul.
Impactos já visíveis e perspectivas para o futuro
Eu já acompanhei de perto diversas iniciativas científicas, mas poucas conseguiram fazer tanto “ruído” positivo entre especialistas como a atualização do SOAR. O STELES, mesmo em seus primeiros meses, passou a influenciar – especialmente entre jovens pesquisadores – o modo de fazer ciência em astrofísica.
Desde a instalação recente, já houve avanços notáveis, como:
- Sensibilidade inédita para identificar sinais de metais em estrelas pouco luminosas e distantes;
- Medições rápidas e precisas de atmosferas estelares em aglomerados distantes;
- Cooperação entre equipes brasileiras e internacionais, que amplia o repertório técnico e científico nacional.
A busca por conhecimento amplia laços e rompe fronteiras.

De acordo com relatos sobre projetos desenvolvidos no CTIO em 2001, investigações desse porte resultaram em saltos no entendimento sobre nascimento de estrelas, dinâmica de aglomerados e evolução de galáxias. Com o STELES, espera-se inclusive superar essas marcas, já que agora temos tecnologia para abordar perguntas ainda mais fundamentais.
No site oficial do SOAR, há detalhes sobre os instrumentos e condições de uso por astrônomos visitantes. Vale a pena conferir o quão eficiente se tornou, principalmente após a chegada do STELES.
STELES: um caminho para novas perguntas
Em todo grande avanço científico, tenho a impressão de que as respostas logo dão lugar a perguntas ainda mais intrigantes. É esse o sabor verdadeiro da pesquisa. Com o espectrógrafo do SOAR, vai ocorrer exatamente isso:
- Análise da evolução química da Via Láctea, desde as primeiras gerações de estrelas;
- Entendimento de como galáxias crescem e se transformam ao longo do tempo;
- Descoberta de possíveis indicadores de matéria escura, ainda um dos principais enigmas da física moderna;
- Medição do ciclo de vida e da rotação de planetas em formação;
- Desbravamento do passado mais remoto do universo, indo além do que nossos olhos enxergam.

STELES no SOAR e a missão do spacetoday.com.br
Neste contexto, percebo uma sintonia natural entre a busca do STELES e a proposta do spacetoday.com.br. Unir informação precisa, avanço científico e a participação cada vez mais ativa do Brasil em projetos de ponta é nossa missão. Quero mostrar que, por trás dos grandes telescópios, há pesquisadores, colaboradores e curiosos – como eu e você!
Sempre que penso na importância desse tipo de divulgação, lembro do quanto uma notícia, uma imagem ou uma explicação pode inspirar a próxima geração. E, afinal, quantos jovens leitores deste artigo vão ser cientistas amanhã? Não posso afirmar, claro. Mas sei que, juntos, podemos ir além de simples espectadores do cosmos. Podemos ser parte ativa, questionando, sonhando e ajudando a transformar o futuro.
O universo está ao alcance do nosso olhar – e agora, graças ao STELES no SOAR, um pouquinho mais perto da mente do brasileiro.
Conclusão
Ao longo deste artigo, compartilhei um retrato do que considero um dos capítulos mais interessantes da astronomia feita no Brasil e para o mundo. O STELES no SOAR representa engenhosidade, coragem e paciência. É fruto de uma colaboração internacional que respeita culturas, valoriza talentos nacionais e mira as perguntas mais complexas da natureza.
O mais fascinante, para mim, é perceber que tudo isso prepara o terreno para descobertas ainda maiores. A busca pelas primeiras estrelas, a compreensão da evolução galáctica e a resposta para as origens dos elementos estão agora mais próximas, graças a inovações nascidas de sonhos e muito trabalho técnico.
If you want to go deeper into the impact of the STELES and the SOAR telescópio, or even see how you, your institution or your curiosity can se conectar with this universe, visite o spacetoday.com.br. Acompanhe nossas novidades e veja como a astronomia feita pelo Brasil pode, de fato, inspirar e transformar o futuro. Vamos juntos, porque o céu é apenas o começo do nosso caminho.
Perguntas frequentes sobre o SOAR, STELES e a pesquisa do Brasil
O que é o telescópio SOAR?
O telescópio SOAR é um observatório óptico astronômico de 4,1 metros, instalado no Cerro Pachón, Chile, focado em pesquisas avançadas do céu do hemisfério sul. Ele permite observações de alta resolução, operando do ultravioleta ao infravermelho próximo, e dispõe de instrumentos modernos para estudos detalhados de estrelas, galáxias e fenômenos astronômicos. Seu consórcio é formado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação do Brasil, NSF NOIRLab, UNC e Universidade Estadual de Michigan.
Como o espectro ajuda na pesquisa espacial?
O espectro é a “impressão digital” que a luz de um objeto nos fornece, permitindo identificar seus elementos químicos, temperatura, movimento, rotação e distância. A análise espectral viabiliza diagnósticos sobre a formação de estrelas, galáxias, planetas e até a detecção de atmosferas extrassolares. Ferramentas como o STELES potencializam essa pesquisa ao separar a luz em diferentes faixas e revelar detalhes invisíveis a olho nu.
Para que serve o projeto STELES?
O STELES serve para ampliar a capacidade do SOAR de obter espectros de alta resolução e ampla faixa de comprimento de onda, facilitando a investigação de estrelas distantes e pouco luminosas. Entre seus objetivos, destaca-se a busca por estrelas da População III, nunca antes observadas diretamente. Seus dados ajudarão a reconstruir a história química da Via Láctea e a responder questões sobre o universo primordial.
Quais descobertas brasileiras com o SOAR?
Pesquisadores brasileiros realizaram medições inéditas de estrelas massivas, atmosferas planetárias e composição química de galáxias, além de participar ativamente da busca por objetos raros no universo distante. O envolvimento nacional se tornou ainda mais relevante após o desenvolvimento do STELES, consolidando o Brasil como referência em instrumentação astronômica de ponta.
Como o Brasil contribui na astronomia global?
O Brasil contribui investindo em infraestrutura científica, promovendo parcerias internacionais, formando mão de obra altamente qualificada e liderando projetos inovadores, como o STELES no SOAR. Essa participação gera novas descobertas, estimula a pesquisa em universidades e institutos nacionais e integra a comunidade científica brasileira aos grandes temas contemporâneos da astrofísica.